A representação feminina estampou inúmeras capas da discografia popular brasileira, mas com Autêntica (2019) Margareth Menezes sintetizou sua própria história, resgatando a memória dos homens e mulheres de sua família, pescadores e marisqueiras, moradores da Península de Itapagipe, região esquecida da Salvador cartão postal.
Soteropolitana, nascida e criada entre o Comércio e a Ribeira, bairros do subúrbio ferroviário da Cidade Baixa que compõem território remanescente quilombola, rapidamente urbanizado pelo Porto e pelas primeiras fábricas instaladas na cidade, a atriz, que enveredou pela música, tornou-se símbolo das trabalhadoras informais, conhecidas na história como ganhadeiras.
De ponta a ponta da cidade, desde os primórdios da atividade autônoma, os trabalhos de ganho se adaptavam às geografias de Salvador. Em Itapuã, ponta oposta ao reduto de criação da cantora, à beira da Lagoa, lavadeiras fizeram a vida e o sustento de gerações. Por toda Salvador, baianas de acarajé, vendedoras de porta em porta iam alimentando a cidade.
Autêntica coroou a imagem da mulher negra brasileira num momento ímpar de seu reconhecimento não somente histórico e cultural para o país, mas a reboque de políticas públicas, resultado da ação dos movimentos negros na participação da vida política.
Lançado em 2019, o álbum tem dedicatória às Marias, Mahins, Marielles e Malês. No carnaval carioca, a marisqueira coroada por crustáceos elaborada por Margareth Menezes para a capa do disco se fez ainda mais exitosa no samba enredo “Viradouro de Alma Lavada”, uma homenagem a todas as ganhadeiras, que saíram vitoriosas do desfile 2020 das escolas de samba do Rio de Janeiro.